O PRÊMIO IG NOBEL
http://www.improbable.com/ig/ig-top.html
IG NOBEL é um trocadilho feito com a palavra Nobel, lembrando "Ignoble", isto é, "Ignóbil", significando algo sem nobreza, baixo, desprezivel, vil ou imundo (N.T.)
Por Marc Abrahams
Editor dos "Anais das Pesquisas Improváveis"
e Presidente da Comissão de Governadores do Ig Nobel
Outubro de 1999
Trad. A.Mattos (Prof. Univ.)
Alguns o desejam, outros fogem dele. Alguns o vêem como um marco da civilização, outros como um marco de esculhambação. Alguns acham graça, outros riem dele. Muitos o glorificam, poucos o condenam, outros são apenas iludidos. E muitos se apaixonam por ele.
É o prêmio IG NOBEL.
Este é o nono ano em que estamos concedendo prêmios Ig Nobel. Talvez você tenha tido muita sorte em ser agraciado com um. Isso não é tão improvável como possa parecer: Muitos dos 976 ganhadores do Prêmio Ig Nobel de Literatura em 1993 podem ainda não ter conhecimento da sua boa sorte. Não está claro se as pessoas que foram co-autoras do artigo científico, publicado no Jornal de Medicina da Nova Inglaterra (vol.329, num.10), chegaram a trocar informações ou cumprimentos ente si, ou pelo menos se ouviram falar do nome de cada um dos demais. O seu artigo, aliás, foi notável por ter cem vezes mais autores do que páginas - o que fez com que fosse premiado. (Trata-se do artigo "An International Randomized Trial Comparing Four Thrombolytic Strategies for Acute Myocardial Infarction", publicado no Jornal de Medicina citado, contendo 9 páginas e 976 autores de 15 paises: http://content.nejm.org/cgi/content/short/329/10/673 N.T.)
Todo ano, dez prêmios Ig Nobel são concedidos. O critério de seleção é simples. Os prêmios são "realizações que não podem ou não devem ser reproduzidas". Examine esta frase cuidadosamente. Ela envolve uma área muito extensa. Ela não diz nada sobre se a coisa é boa ou má, recomendável ou perniciosa.
Por exemplo: Depois que alguma coisa tenha sido descoberta ou criada, ninguém - seja quem for ou onde for ou quando for - poderá se tornar o primeiro a ter feito a descoberta ou a criação. A "primazia" não poderá ser repetida. Assim, Don Featherstone (Prêmio Ig Nobel de Arte de 1996), o criador do "Flamingo de Plástico Cor de Rosa", claramente se enquadra na cláusula "não pode ser repetido". (v. http://www.mjdtools.com/books/51273.htm N.T.)
No caso de Anders Barheim e Hogne Sandvik (Prêmio Ig Nobel de Biologia de 1996), que descobriram que o iogurte estimula o apetite das sanguessugas, mas que a cerveja as intoxica e que o alho costuma matá-las, sua pesquisa claramente se qualifica como "não pode ser repetida". (o artigo informa que o alho também tem efeitos sobre os vampiros: http://www.uib.no/isf/people/doc/leech.htm N.T.).
Eu levantei esta questão do bom e do mau porque o mundo em geral parece gostar de classificar as coisas como sendo boas ou más. Prêmio Ig Nobel à parte, a maioria dos prêmios, na maioria dos lugares, na maior parte dos casos, são claramente projetados para enaltecer a bondade ou a maldade dos agraciados. As Medalhas Olímpicas se destinam aos atletas muito bons. O prêmio dos Mais-Mal-Vestidos vai para as celebridades que pior se vestem. Os Prêmios Nobel são concedidos aos cientistas, escritores e outros considerados excepcionais. Erros ocasionais e omissões acontecem, mas esses prêmios, e a maioria dos outros, objetivam honorificar os extremos da humanidade - aqueles cujas realizações devem ser encaradas como muito boas ou muito ruins.
O prêmio Ig Nobel não é assim. O IG, como é conhecido, honra o grande trapalhão que existe dentro de cada um de nós, na maior parte do tempo. A vida é confusão. O bom e o mau estão sempre misturados. Yin pode ser difícil de distinguir de Yang.
A maior parte das pessoas passa pela vida sem ser agraciada com um grande, gordo prêmio, certificando que, de fato, elas fizeram alguma coisa. Eis porque concedemos o prêmio Ig Nobel. Se você obtiver um, significa que você fez alguma coisa. O que essa coisa é, pode ser difícil de explicar - pode até ser totalmente inexplicável. Se sua realização se destina a um público bom ou mau, pode ser difícil ou mesmo doloroso explicar. Mas o fato é que você fez alguma coisa, e você foi reconhecido por ter feito isso. Deixe que os outros façam desse reconhecimento o que quiserem.
A cada ano, para cada dez novos prêmios Ig Nobel, cerca da metade são outorgados por coisas que a maioria diria ser recomendável - mesmo sendo talvez idiotas. A outra metade vai por ter havido coisas que são, aos olhos de algumas pessoas, menos recomendáveis.
Todos esses julgamentos são inteiramente devidos a cada observador. Isto torna os prêmios potencialmente úteis e agradáveis.
Digamos que você tenha feito alguma coisa que acredita ser muito, muito boa, e talvez até mesmo muito, muito importante. Mas a maioria não reconhece a sua importância. Pior: não reconhece nem mesmo a sua existência. É diferente do que eles esperam, ou até do que eles já viram. O que você tem, você crê, é uma inovação. A seqüência clássica de eventos que acompanham uma inovação é:
(1) A maioria não reconhece sua existência;
(2) Quando reconhece, a reação imediata é a risada ou o deboche;
(3) Alguns ficam curiosos e começam a refletir, acabando por apreciar o seu real valor.
Assim, você tem o agradável beneficio do prêmio Ig Nobel. Se as pessoas debocham daquilo que você fez, e você ganha um Ig, então mais pessoas vão ouvir falar de você. E talvez alguns também fiquem curiosos, e reflitam a respeito, e acabem por se apaixonar pela sua realização.
Claramente isso aconteceu com o experimento de Peter Fong, quando ele injetou Prozac (um anti-depressivo NT) em moluscos (Prêmio Ig Nobel de Biologia de 1998); ou com a explicação de Robert Matthews sobre a torrada que cai no chão com a manteiga virada para baixo (Prêmio Ig Nobel de Física de 1996); ou com o relatório de Harold Hillman sobre "As possíveis dores sentidas durante uma execução usando diferentes métodos" (Prêmio Ig Nobel da Paz de 1997); ou com a análise de Jerald Bain e Kerry Siminoski: "A relação entre a altura, o comprimento fálico, e o tamanho do pé" (Prêmio Ig Nobel de Estatística de 1998).
A análise detalhada pode levar a dois resultados. Sua grande descoberta pode ser considerada menor do que um trabalho de mestre. Assim ocorreu com Jacques Benveniste (Ig Nobel de Química de 1991 e 1998) por suas descobertas sobre as moléculas da água, que se lembram de coisas, e que suas memórias podem ser transmitidas pelas linhas telefônicas; com Louis Kervran (Ig Nobel de Física de 1993) e sua descoberta de que o cálcio nos ovos da galinha é criado por um processo de fusão a frio; com Shigeru Watanabe, Junko Sakamoto e Masumi Wakita (Ig Nobel de Psicologia de 1995) por seus achados no treinamento de pombos para distinguirem as pinturas de Picasso das de Monet; com Richar Seed (Ig Nobel de Economia de 1997) pelo seu projeto de clonagem de si próprio e de outros seres humanos. Ao que me consta, ganhar um prêmio Ig Nobel em nada reduz as chances de ganhar um prêmio Nobel.
Isto leva ao outro ponto que deve ser mencionado. A Comissão de Governadores do Ig Nobel segue o mesmo ditado que dizem inspirar os médicos: "Primeiro, não machuque".
Existe neste mundo pessoas apressadas em emitir julgamentos e a condenar ou punir os outros. Algumas dessas pobres pessoas estão em posições de mando e podem estar inclinadas a, digamos, punir ou ridicularizar alguém no seu laboratório por ter ganho um prêmio idiota e sem valor. Por sabermos que tais pessoas existem, a Comissão de Governadores do Ig Nobel consulta os cientistas que estão com chances de obter um Ig, para saber se a concessão do prêmio poderia criar-lhes dificuldades profissionais. Nos casos em que houver riscos, o prêmio não é outorgado a essa pessoa, indo para outra. Até hoje, isso ocorreu em cerca de seis casos.
Muito mais comum é o caso em que uma pessoa ou um grupo insiste em receber um Ig. Isto tem ocorrido mais vezes do que podemos enumerar. Até agora, apenas um foi concedido a tais caçadores de prêmios (ao grupo de Barheim e Sandvik). Mas quem poderá dizer o que o futuro nos reserva?