CORREÇÃO MONETÁRIA:
reajuste periódico e automático de valores, de acordo com determinados índices que
traduzem a taxa de inflação. (6)
Assim, quando o governo diz que o valor do imposto é de 537 UFIRs,
está usando o expediente da Correção Monetária. É sinônimo de Indexação (110)
(113) (114). O Brasil, junto com Israel, foram os únicos países que institucionalizaram
esse mecanismo monetarista de convivência com a inflação, talvez baseado no ditado
americano que diz: "If there is no solution, relax and enjoy" ("Se o
problema não tem solução, relaxe e aproveite")...
Uma interessante analogia, procurando ilustrar a mecânica da
correção, foi mostrada por Tognollo (197):
Filha adotiva da revolução de 64, foi criada dentro de princípios
rígidos e irreais, com a única finalidade de diminuir os males causados por um inimigo
comum. Ensinaram-lhe a minimizar as conseqüências, mas não a combater este inimigo, que
desde cedo soube chamar inflação.
Poderíamos comparar, grosso modo, a inflação ao agente que furta
uma carteira recheada de dinheiro. O ato foi presenciado pela correção monetária, que
seguiu a inflação durante algum tempo até que, no início do mês seguinte, localizou o
seu esconderijo e lá adentrando, encontrou apenas a 'res' furtiva, que foi devolvida à
vítima, através do setor de achados e perdidos. Note-se que o fato não foi levado ao
conhecimento da autoridade policial e o crime ficou impune. E todos ficaram felizes: a
vítima porque recuperou a carteira, a correção porque praticou uma boa ação, e a
inflação porque, neste ínterim, gastou algumas cédulas, o que, inicialmente, passou
desapercebido.
Estranho esse mecanismo criado que, ao invés de tentar eliminar o
agente nocivo, alijando-o da sociedade, outra coisa não faz senão tentar confortar a
vítima pelo mal sofrido.
As conseqüências práticas da Correção Monetária foram expostas
pelo ex-ministro Simonsen (32, p.196):
- Estímulo às Cadernetas de Poupança,
que passam a ter juros reais positivos (0,5% a/m), pois estes são computados depois da
correção monetária do saldo. Antes de 1964, quando não havia essa separação, as
taxas reais sempre resultavam negativas, pois as taxas pagas eram inferiores à taxa de
inflação. Aplicar na Poupança era, portanto, um desinvestimento, ou seja, perda de
dinheiro na certa (incidentemente, esta situação se repetiu em 79, 80 e 83, quando as
ORTNs, base da correção, foram "expurgadas").
- A obtenção de recursos para o
financiamento dos déficits governamentais passou a ser viável, como no
caso das ORTNs e LTNs, que oferecem taxas positivas. Antes do instituto da correção
monetária, o governo só conseguia dinheiro através dos "empréstimos
compulsórios" (isto é, obrigatórios), que não passavam de um imposto travestido
de empréstimo.
- A tributação tornou-se mais justa,
pois a correção monetária deixou de ser considerada renda, e portanto não mais sofre
tributação. Assim, as parcelas correspondentes à correção monetária na
Poupança, na venda de imóveis, nos ativos das empresas etc., passaram a ser isentas do
Imposto de Renda (com o advento da Nova República, esse assunto voltou a ser novamente
ventilado).
- Como sobre as dívidas não havia a cobrança da correção
monetária, mas apenas dos "juros de mora" ("juros de demora") de 1%
a/m, atrasar o pagamento equivalia, em termos reais, a
obter descontos vantajosos. Eram, assim, constantes os atrasos no
pagamento de impostos, taxas e dívidas em geral. A concordata era um "santo
remédio" para as empresas em dificuldades ou para os escroques, embora se
constituísse em uma sangria para os seus credores e fornecedores.
- A criação do Fundo de Garantia por
Tempo de Serviço, uma poupança forçada que rende juros e correção
monetária, estimulou a construção civil e o mercado imobiliário em geral. Mas, por
outro lado, também corrigiu as prestações dos mutuários (devedores) do BNH em termos
reais, levando muitos à insolvência após a recessão de 1979 em diante, já que seus
salários não acompanhavam a correção monetária, pois estavam sendo arrochados.
- Provocou uma realimentação
inflacionária, pois a correção de um mês passou a ser calculada com
base nas correções dos meses anteriores, dificultando a sua queda e, conseqüentemente,
a da inflação dela dependente.
- Beneficiou os que vivem de rendimentos
("rentiers" ou rendeiros, proprietários de imóveis que recebem aluguéis,
aplicadores em títulos e letras de câmbio, possuidores de Cadernetas de Poupança etc.)
pois o aumento das rendas (excetuados os anos de 79, 80 e 83) nunca foi inferior à
inflação, já que sofriam as mesmas correções que as ORTNs. Claro que os que pagam
juros deixaram de usufruir, como dantes, as taxas negativas de juros de empréstimos, bem
como os inquilinos, que não mais se beneficiaram dos aluguéis sempre declinantes, em
termos reais. Assim, se na situação pré-1964 a renda era redistribuída, levando-a dos
proprietários para os inquilinos, dos Bancos para as empresas, dos acionistas para as
Sociedades Anônimas, após esse ano o sentido da distribuição se inverteu.
- As empresas públicas prestadoras de serviços como água, gás,
telefone etc., tiveram a vantagem de ver suas tarifas
corrigidas pelos índices vigentes, eliminando a descapitalização que
vinham sofrendo, facilmente perceptível pela declinante qualidade dos serviços prestados
e pelo baixo nível de seus funcionários.
- Como as correções dos preços e dos custos das empresas passaram a
ser automáticas e realistas, os assalariados,
sobre quem recai esses preços, acabam sendo prejudicados,
já que as empresas conseguem aumentar os preços muito mais rapidamente do que os
trabalhadores sobem seus salários.
A ORTN foi abolida em 27-fev-86 (Dec-Lei 2.283), juntamente com a
desindexação geral da economia, e substituída pela OTN, com reajustes anuais. Depois
veio a BTN e a TR.