APÊNDICE 14

O QUE É IDEOLOGIA

Quando ouço a palavra Cultura,
levo logo a mão à pistola
Joseph Goebbels (1897-1945)
Ministro da Propaganda de Hitler
Presidente da Câmara de Cultura do 3º Reich
Doutor em Filosofia pela Univ. de Heidelberg

Toda pessoa possui uma ideologia (ou uma crença) que pode assumir gradações desde a extrema-direita até a extrema-esquerda, passando pela direita, centro-direita, centro, centro-esquerda e esquerda. Não há uma fronteira definida entre duas posições próximas. Existem, entretanto, maneiras de se estimar a ideologia de uma pessoa, através da análise de seu comportamento (não do que ela diz, mas sim do que faz) *.

O que caracteriza cada uma dessas sete posições é a receptividade -- ou aversão -- que cada um pode ter com relação às mudanças, sejam elas sociais, econômicas, políticas, técnicas etc.

Num caso extremo, onde se acha que o mundo está errado e precisa ser totalmente reformado, destruindo a ordem existente e construindo uma outra, temos os extremismos. Se essa outra ordem é nova e ainda inexistente, temos o terrorismo de esquerda, como é ocaso de organizações como Grupo Motoneros (Argentina), Vanguarda Popular Revolucionária (Brasil), Comando Baden-Meinhoff (Alemanha) e Sendero Luminoso (Peru). Se, ao contrário, a outra ordem defendida é a volta ao passado (por exemplo, reinstaurando a monarquia no Brasil), temos o terrorismo de direita, representado por organizações como a Klu-Klux-Klan (KKK, EUA), Partido Neonazista (Alemanha), Comando de Caça aos Comunistas (CCC, Brasil), Aliança Anticomunista Argentina (AAA) etc.

As organizações extremistas possuem uma estrutura paramilitar, voltada para a ação violenta, como se nota nos episódios de direita do Rio-Centro, do golpe de 1964, do assassinato dos Kennedy's e da revolução do aiatolá Komeini; ou nos de esquerda, como os liderados por Lamarca e Mariguela.

Quando se é contra a atual situação, mas não se pretende mudanças através da violência mas sim via ação política pacifica, temos as ideologias de direita -- volta ao passado -- ou de esquerda -- ida para uma nova experiência.

Os que possuem ideologia de direita são também chamados de tradicionalistas, conservadores, reacionários, nazistas, fascistas etc., enquanto que os de esquerda são denominados comunistas, socialistas, anarquistas, nihilistas etc. Tais adjetivações não são necessariamente sinônimos, pois um israelita de direita não é nazista, bem como um revolucionário irlandês não é comunista.

Entre os dois lados ideológicos mencionados, existem aqueles que acham que uma parte da ordem estabelecida deve permanecer como está, enquanto que a outra deve ser reformulada, quer voltando ao passado -- os de centro-direita -- quer partindo para novas experiências -- os de centro-esquerda.

E, finalmente, a posição de Centro, onde se admite que a situação está boa e assim deve permanecer.

Uma interessante classificação, publicada na revista Isto É (já citada), está transcrita no quadro Traços ideológicos Aproximados (mais adiante).

É importante ressaltar que a ideologia de uma pessoa não é imutável, mas resultado de sua situação econômica, variando, pois, com ela.

Assim, quem é rico e está satisfeito com sua condição, tende a assumir posições à direita, conservadoras, pois tem um patrimônio a defender. Inversamente, para quem a sorte não foi favorável, a esquerda é mais bem vista.

O conhecimento da ideologia é multo útil, na medida em que ajuda a compreender os comportamentos e as manifestações das pessoas, bem como a linha econômica e política defendida **. Com efeito, ao contrário do que muitas vezes se tenta impingir à sociedade, a Economia não é um conjunto bem estabelecido de leis neutras, como a Física ou a Matemática. Ao contrário, existem várias "Economias" dentro da mesma Ciência Econômica e a opção por uma delas é uma decisão sobretudo ideológica. Não levar em conta esse fato é se perder em um cipoal de leis e teorias, que por vezes se contradizem mutuamente -- caso do marxismo versus monetarismo, ou mesmo deste versus institucionalismo -- trazendo como resultado um imobilismo frente aos desafios do mundo moderno.

Foi por essa razão que J. Stuart Mill disse que "Uma pessoa com uma crença é um poder social igual a noventa e nove outras que só têm interesses." ***

 

TRAÇOS IDEOLÓGICOS APROXIMADOS
  Racional Flutuante Emotiva
Extrema-direita A razão a serviço dos privilégios. Os nostálgicos do passado. Jogadores de bombas.
Direita Os elitistas. Escoteiros da renovação. Ingênuos. Os exaltados. Pátria e Família.
Centro-direita Os imobilistas. A arte de evitar avanços. Os temerosos das verdadeiras mudanças. Pseudomodernistas a serviço do status quo.
Centro Tudo vai bem no menos pior dos mundos. Um passo de cada lado. Desejo temeroso de mudança.
Centro-esquerda Novas aspirações com métodos antigos. Um passo a cada dia com prudência. Mudanças com respeito às instituições.
Esquerda Difícil casar humanismo com eficiência. Como conciliar estratégia e ideologia? Até onde mudar a sociedade?
Extrema-esquerda Agüentar e esperar o grande dia. Desinibição, humorismo e dúvida. O povo acima de tudo.

Fonte. Isto É (17-set-80) e Le Nouvel Observateur.


Notas:

* Veja a respeito o Teste ideológico publicado na revista Isto É, em 17-set-80 p.48. Veja também o artigo "Quem é quem na Constituinte", na Folha de S. Paulo, de 19-jan-87, p. B-1. voltar ao texto

** Tal é o caso da Constituinte de 1987. O choque ideológico de posições contrárias fez com que o anteprojeto parecesse uma colcha de retalhos. Na realidade, ao invés do que se dizia, não se tratou de incompetência do poder político, mas tão somente do resultado de crenças antagônicas que não conseguiam se conciliar em um texto coerente e num ambiente democrático (veja, por exemplo, a crítica do prof. Ney Prado, em seu livro Os notáveis erros dos notáveis. Ed. Forense, 1987). voltar ao texto

*** Para se aprofundar nestas questões veja Ideologias políticas contemporâneas de Roy C. Macridis, Ed. Univ. de Brasília, 1980. voltar ao texto