O  FIM  DO  ENSINO  TRADICIONAL

 

Ensino superior a distância
Estadao, 13-nov-2005

UMA EXPERIÊNCIA DE SUCESSO QUE SÓ PRECISA NÃO SER DESVIRTUADA

Entre as revoluções causadas pelo desenvolvimento tecnológico das últimas décadas, uma das mais importantes se processa no campo da educação. Graças ao avanço da microeletrônica e das telecomunicações, professores hoje têm rápido acesso às mais importantes bibliotecas do mundo, alunos dispõem de amplas fontes de informação para preparar trabalhos e pesquisadores das mais distantes regiões do planeta podem, por meio da internet, conversar entre si e trocar experiências em tempo real. As próprias técnicas pedagógicas também mudaram, despertando a inquietação intelectual, abrindo novos horizontes e estimulando a autoaprendizagem.

A expansão do ensino superior a distância é um dos aspectos da revolução educacional.

Originariamente, ele surgiu na Inglaterra por meio da chamada 'universidade aberta', uma instituição pública concebida para qualificar estudantes de origem operária, que precisavam trabalhar e não tinham condições de se manter durante a graduação nas cidades onde se localizavam as universidades inglesas. Até o final do século 20, esse tipo de ensino se circunscrevia a aulas transmitidas pelo rádio e pela televisão e à remessa de textos-base pelo correio. De lá para cá, o sistema se sofisticou, foi implantado em muitos países e envolve renomadas instituições de ensino superior.

No Brasil, embora esse tipo de ensino tenha sido implantado na década de 70, por meio de um projeto pioneiro da Universidade de Brasília (UnB), ele só começou a se expandir a partir de 2001, quando o Ministério da Educação (MEC) permitiu às universidades oferecer até 20% das aulas de graduação e pós-graduação a distância. Em dezembro de 2004, o MEC aperfeiçoou a legislação e reduziu as exigências burocráticas para credenciar novos cursos. Atualmente, 166 universidades públicas, privadas e confessionais já adotam esse sistema, várias delas com apoio técnico de instituições internacionais.

Para as universidades, esse sistema permite aumentar a escala de suas atividades, racionalizar a distribuição da carga horária do corpo docente e poupar investimentos em expansão de espaço físico. Em contrapartida, elas têm de elaborar uma pedagogia própria para a internet, digitalizar livros e apostilas, adotar programas com exercícios e links que remetam a sugestões bibliográficas, oferecer infra-estrutura de acesso eletrônico aos alunos, criar plantões de professores para esclarecimento de dúvidas em sala de aula ou mesmo pela internet, promover com regularidade encontros pessoais entre eles e um professor-tutor e aplicar provas 'presenciais'.

Como esse tipo de ensino depende basicamente da iniciativa, da seriedade, da capacidade de concentração e da maturidade do corpo discente, quanto mais velhos são os alunos melhor o aproveitamento das aulas. Embora o ritmo de navegação na internet fique por conta deles, as universidades têm de controlá-los a partir do momento em que entram no site, verificando tanto a freqüência quanto o tempo gasto na leitura de cada texto ou na resolução de cada exercício. Por isso, essa experiência ainda esbarra em forte resistência de determinados setores da comunidade acadêmica. O temor de muitos pedagogos é que ela aumente ainda mais a atual massificação do ensino superior brasileiro, distribuindo diplomas sem credibilidade.

Já os adeptos dessa experiência afirmam que ela estimula o auto-aprendizado. 'O desafio é ensinar grandes contingentes sem perder qualidade, pois o ensino a distância é autoaprendizagem. O aluno passa a ser sujeito que vai atrás do conhecimento. Não é mais um aluno passivo', diz a professora Beatriz Tavares Franciosi, da PUC-RS, responsável por um projeto piloto no curso de administração.' Acredito que dentro de dez anos aulas assim vão ser a coisa mais corriqueira do mundo', endossa Fredric Michael Litto, coordenador da Escola do Futuro, da USP.

Independentemente dessa polêmica, o ensino superior a distância é uma realidade com excelentes resultados já alcançados nas disciplinas teóricas e nas que exigem repetição de exercícios, como as de ciências exatas. Diante de sua importância, o sucesso dessa experiência é mais do que bem-vindo. Mas, para que não seja desvirtuada, o MEC precisa fiscalizá-la com rigor.